ELE ANALISA A PRIMEIRA TRADIÇÃO E COMPARTILHA INTERESSANTE REFLEXÃO SOBRE UNIDADE EM A.A.

Cresci num lar onde meus pais fizeram muitos sacrifícios pessoais, com discussões sem fim, decepções e amarguras que respingaram em mim. Levar algum amigo à nossa casa era um pesadelo e, quando acontecia, eu era punido injustamente. Acabei desenvolvendo certo trauma de relacionamentos afetivos, fechando-me em mim mesmo. Penso que assumi grande parcela da responsabilidade pela falta de momentos felizes na vida de meus cuidadores. Acostumei-me com a ausência de bem-estar comum e com a presença quase permanente de mal-estar, medo e vergonha.

Acredito ter também me acostumado a administrar sozinho meus problemas, nunca confiando na cooperação de outrem para me ajudar, nunca delegando nada a ninguém: Quanto mais pessoas se juntarem a mim, pior estarei – assim pensava. Permanecer isolado se tornou meu modelo de bem-estar.

Foi assim que ingressei no programa. Hoje me considero um guardião das Doze Tradições, mesmo tendo que me esforçar para permanecer em unidade com os demais companheiros, já que estar com outros ainda gera incômodo.

Ao ler o texto da nossa Primeira Tradição, vejo um claro exemplo de mal-estar comum: sobreviventes de um acidente aéreo caem no mar, sobrevivem num bote, não podendo se dar ao luxo de sair dali ou tentar se salvar isoladamente. Num caso desses, unidade não é opção, mas sim condição.

Para mim, a Primeira Tradição tem a ver com isso: alcoolismo é doença desastrosa, mortal. Manter nossa unidade e cooperação não é uma opção, mas uma necessidade de vida ou morte.

Assim, a palavra que resume a Primeira Tradição para mim passa a ser UNIDADE. Os sacrifícios requeridos para a preservação da unidade, autossuficiência ou anonimato podem me trazer algum mal-estar momentâneo, mas o resultado final após certo período praticando esses princípios é bem-estar geral, com sentimentos de autoconfiança e autoestima, além de autorrespeito.

Unidade e cooperação praticadas diária e primariamente no grupo serão requeridas, também, no serviço em outros órgãos e comitês da estrutura de serviço da Irmandade, voltados às relações com instituições de saúde, ensino, justiça e segurança pública, dentre outras. 

Nossa literatura, a revista Vivência e eventos da Irmandade me lembram da cooperação e unidade também com Al-Anon e Alateen, assim proporcionando bem-estar para muitas outras pessoas.

Mas, para colocar em prática essas ações, muitas vezes precisei e ainda precisarei suportar certas doses de mal-estar.

Escrever este depoimento pessoal levou tempo, sacrifício, paciência, mas no final gerou bem-estar para mim e, talvez, para outros que o lerão. 

Um anônimo em unidade. F.R., Área 04-SP
Fonte: Revista Vivência, edição 209, páginas 16 e 17.